terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Treze Pro-Vocações sobre as Diretrizes Gerais da Ação Evagelizadora no Brasil 2011-2015


Márcio Macico l’Oliveira

Para cumprir sua missão, a Igreja, impulsionada pelo Espírito Santo, acolhe, reza a Palavra que salva, escuta os sinais dos tempos, revê práticas pastorais e discerne objetivos e caminhos.
Dom Leonardo U. Steiner, Apresentação das DGAE’11-15.

O cristão do futuro será um místico - alguém que experimentou alguma coisa - ou não será nada.
Karl Rahner

A Igreja é o melhor lugar.../É minha raça, estou/ em casa como no meu quarto.
Adélia Prado, Bagagem.
Primeiro Passo

1. Con-templar Jesus. ‘Quando con-templamos verdadeiramente Jesus percebemos que ele arma sua tenda no meio de nossa realidade’ (cf. DGAE 4-5; Jo 1,14). Mas que Jesus? Onde está Jesus? Quem é esse Jesus mesmo? O que tem nos anunciando? É míster saber onde procurar o Senhor, isso, pois, Ele nos pede que o procuremos em meio a seus pequeninos, seus pobres, seu povo. A todo momento está comunicando-se conosco e nos convidando para festa do Reino (cf. Lc 14,15-24). O encontro pessoal e comunitário que um dia – ou todo dia – fizemos com Ele, precisa ser alimentado para que, a partir de nós, seu Evangelho ressoe no mundo. São os ‘olhos de Jesus’ – “Vendo a multidão, ficou tomado de com-paixão...” (Mt 9,6) – nos nossos olhos, que nos permitirão alcançar essa realidade tão complexa.

Marcas de Nosso Tempo

2. ‘Incertezas’ de critérios. Os ‘olhos de Jesus’ nos fazem ver a verdadeira face da realidade que está a nossa frente. Entre os mais desafiadores dos traços desse tempo em que vivemos está a inseguraça e dúvida em relação aos valores e questões fundamentais da vida: afinal, o que é mesmo importante em nossa vida? Ainda mais, não se trata só da ‘escolha de critérios’ - escolher entre o bem e o mal -, mas “as mudanças de época atingem os próprios critérios de compreender a vida, tudo o que a ela diz respeito, inclusive a prórpia maneira de entender Deus” (DGAE 25) – a questão agora é: ‘o que é o bem?’ ‘O que é mal?’. E isso se torna preocupante ao pontos de não sabermos ao certo do que estamos falando ou o que estamos fazendo, ou seja, podemos estar falando de fé, mas nossa vida não expressa nenhuma crença especial. Vivemos em “tempos líquidos”, é preciso segurar-se em algo, mas não sabemos em que segurar direito, as coisas escorrem de nossas mãos[1].

3. Individualismo e fundamentalismo. Nesse tempo “di-verso”, a noção de compromisso e pertença ficam completante comprometidas, sem falar na questão da justiça que, fica quase impossível porque o que vale é a ‘Lei de Gérson’: “O melhor para mim!” As comunidades têm experimentado como pode ser violento o individualismo na evasão de seus membros. Já se falou: “Jesus, sim! Igreja, não!”, mas hoje a máxima parece ser: “Jesus, não! Igreja, nem pensar!” Associado ao individualismo, no âmbito religioso, “o fundamentalismo torna-se ainda mais perigoso, pois impede que perceba o outro como diferente” (DGAE 23): o outro - pessoa, Igrejas e religiões -, que deveriam ser nossa ‘completude’ (E. Levinás), tornam-se nosso ‘inferno’ (J. P. Sartre). Essas questões nos afetam diretamente por que mexem com nossos ser Igreja, que implica em vida comunitária, diálogo, amizade e constução “conjunta” de um outro mundo possível.

Fontes da Evangelização

4. ‘Palavra do Senhor’, Vaticano II e Aparecida. É tempo de voltarmos com particular atenção e assiduidade às fontes de nossa fé: à Palavra de Deus, de forma particular impulsinoda pela Exortação Apostólica Pós-Sinodal “Verbo Domini”, do Papa Bento XVI sobre a Palavra de Deus na vida e missão da Igreja; aos documentos do Concílio Vaticano II (na esteira da celebração de seu Cinquentenário), a maior autoridade em ensinamento da Igreja, sobretudo no que diz respeito ao diálogo com as outras Igrejas e religiões, com o homem moderno e com o mundo de hoje, que nos incita dizendo: “... a Igreja reza e trabalha ao mesmo tempo, para que a plenitude do mundo todo entre no grêmio do Povo de Deus” (LG 17); e ainda, no nosso contexto latino-americano e brasileiro, o Documento de Aparecida é o ‘catecismo pastoral’ dos discípulos missionários, onde compreendemos que “nenhuma comunidade deve isentar-se de entrar decididamente, com todas as suas forças, nos processos constantes de renovação missionária e de abandonar as ultrapassadas estruturas que já não favorecem a transmissão da fé” (DAp 365b).

Constantes da Evangelização

5. Conversão pastoral. É preciso “ir além de uma pastoral de mera conservação” (cf. DAp 370). Só iremos compreender e transformar evangelicamente a realidade eclesial e social em que vivemos se nossa forma de ser e fazer Igreja passar por uma “conversão estrutural”; as estruturas ‘velhas’ de ação pastoral não estão conseguindo dar resposta as perguntas dos homens e mulheres deste tempo. Essa mudança precisa ser radical (a partir da ‘raiz’) expressa com uma presença missionária que esteja atenta as preces ‘silenciosas’ e ‘silenciadas’ de nossos irmãos onde estiverem. Pastores e lideranças, pastorais e movimentos, organismos e estruturas não podem precindir dessa transformação, pelo contrário ela dese assumida comunitariamente.

6. Urgências. Urgente é aquilo que não se pode adiar, mas para a missão dos discípulos missionários, é mais que isso, “urgências” são necessidades e ao mesmo tempo ‘exencialidades’ de nossa Igreja. É mais que dizer ‘prioridade’, é aquilo que, inclusive, toda prioridade deve priorizar. São elas: Igreja em estado permanente de missão; Igreja: casa da iniciação cristã; Igreja: lugar de animação bíblica da vida e da pastoral; Igreja: comunidade de comunidades; Igreja a serviço da vida plena para todos. As urgências precisam ser os perenes, permanentes e persistentes compromissos da Igreja, sem as quais, a Igreja não conseguirá eficazmente levar em frente o Reino de Deus.

Cinco Urgências

7. Urgente saída. Será que conseguimos definir com facilidade o que é missão? Ou qual o significado da missão hoje? Diz Dom Hélder Câmara: “Partir, mais do que devorar estradas, cruzar mares ou atingir velocidades supersônicas, é abrir-se aos outros, descobrí-los, ir-lhes ao encontro!” Não se trata de um tempo expecífico de nosso calendário pastoral ou um lugar previamente escolhido, o tempo de missão (do latim, missio, que quer dizer ‘envio’) é sempre “o hoje” e os lugares de exigente missão estão ao nosso lado, em nossa frente gritando uma presença cristã; é preciso ir longe (hoje “Cristo aponta para a Amazônia”, dizia Paulo VI), mas não esquecer daqui de perto. Essa “urgente saída”, “permanente missão” (cf. DGAE 31) diz respeito ao nosso ser cristão, ao batismo que acolhemos, a con-vocação Jesus, frente a qual, quiçá, possamos responder com Paulo: “Ai de mim se eu não evangelizar!” (1Cor 9,16).

8. Urgente (re) iniciação cristã. Ao olharmos sobre nós mesmos devemos reconhecer em nossa comunidade a “Casa de Iniciação Cristã”, ou seja, lugar de “suscitar nos corações o seguimento de apaixonado” (DGAE 38) a Jesus. Começar o ‘catecumenato’ na paróquia é um tímido início, mas que isso, é mister envolver todas ações, pastorais, movimentos e estruturas numa dinâmica catecumenal: anunciar Jesus (“kerigma”), proporcionar experiência de diálogo fraterno (“dia-logia”), apontar caminhos para o serviço (“diakonia”) e testemunhar o Reino juntos (“martiria”), ou seja, “é preciso ajudar as pessoas a conhecer Jesus Cristo, fascinar-se por Ele e optar por segui-lo” (DGAE 40).

9. Urgente (re) descoberta da Escritura. A Sagrada Escritura precisa voltar a ser o centro fometador de vida em nossas comunidades e deixar ser ‘intrumentalizada’ em momentos litúrgicos e reuniões. “O atual momento da ação evangelizadora convida o discípulo missionário a redescobrir o contato pessoal e comunitário com a Palavra” (DGAE 45), pois “ignorar as Escrituras é ignorar o próprio Cristo” (S. Jerônimo). Ela é a primeira e grande fonte de nossa fé. Ela nos faz perceber que “Deus fala misturado nas coisas: os olhos da gente percebem só as coisas, mas a fé enxerga Deus que aí nos fala”[2].

10. Urgente! Rede de comunidades. É em meio às alegrias e angústias das comunidades que os discípulos missionários realizam o seguimento de Jesus. “Sem vida em comunidade, não há como efetivamente viver a proposta cristã, isto é, o Reino de Deus” (DGAE 56), na comunidade Jesus confronta e questina, chamando-nos a construir um Igreja profética e uma sociedade justa e solidária. A Igreja é comunidade de comunidades e deve esmerar-se em ser rede de comunidades, um espaço plural e frutuoso, escola de diálogo, amor, justiça e fé, onde os cristãos com criatividade e sensibilidade possam realizar-se como os primeiros cristão: “Eles mostravam-se assíduos ao ensinamento dos apóstolos, à comunhão fraterna, à fração do pão e às orações” (At 2,42). Isso só será possível através da renovação das paróquias, mudança no cerne de suas estruturas, por exemplo, através de sua ‘setorização’ em unidades menores, a qual, de forma particular, os leigos e leigas possam exercer seus diversos ministérios em comunhão com seu pastor (cf. DGAE 138).

11. Serviço testemunhal urgente. “As alegrias e esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos que sofrem, são também as alegrias e esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo” (GS 1), diz o Vaticano II. A Igreja como “advogada da justiça e dos pobres” (cf. DGAE 113), não pode, de forma alguma ‘olhar de fora’ os dramas e dores de nossa sociedade, logo que são os dramas e dores de seu povo, nossos irmãos. Por isso é fundamental mirar os “novos rostos dos pobres” (DAp 402) e efetivar a opção pelos pobres, como uma opção do próprio Jesus, não assitencialista e concreta, a partir de nossas comunidades, espaços de fraternidade, justiça e esperança.

Como Fazer

12. Pensar a ação. “Quem faz um poema abre uma janela”, diz Quintana[3]. Poesia tem muito haver com pastoral, quem faz pastoral também abre janelas, portas, portinholas, frestas, buracos, por sua vez, estas levam para o mesmo lugar: o Reino de Deus. Por isso é preciso planejar: “Planejar é ‘pensar a ação’ antes, durante e depois dela” (DGAE 123). Na maioria das vezes conseguimos até planejar, mas nossos planejamesntos não condizem com a realidade ou carecem de coerência prática; ou seja, não estamos pensando bem! A comunidade é a nossa casa, ela será bem melhor quando nós a fizermos assim.

13. Passos Fundamentais. No nosso planejamento podemos seguir alguns passos: (VER) 1) Onde estamos: conhecer nossa realidade, ‘colocar os pés no chão!’ (cf. DGAE 127); 2) Onde precisamos estar: pontuar os lugares de ação no âmbito da pessoa, da comunidade e da sociedade; 3) Quais são nossas urgências: expecificar o essencial de ‘onde devemos estar’; (JULGAR) 4) Que precisamos alcançar: elencar objetivos claros e pontuais; 5) Como vamos agir: buscar iluminação dos documentos da Igreja, de forma particular nas DGAEs, no Vaticano II e, claro, na Escritura; (AGIR) 6) Que vamos fazer: programar a ação evangelizadora; 7) Renovação das estruturas: mudar as estruturas pastorais de ação.


[1] cf. BAUMAN, Zygmunt. Tempos líquidos. Rio de Janeiro: Zahar, 2007, p. 7.
[2] MESTERS, Carlos. Bíblia: livro feito em multirão. Sâo Paulo: Paulus, 2007, p. 10.
[3] QUINTANA,Mario. Apontamentos de história sobrenatural. São Paulo: Globo, 2005, p. 188.


segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Mamute


 Macico M




Estou farto de não
estar farto de nada
e o meu cristo não está
dependurado na parede
Sim
espero o mamute sair da geleira
com seu barrido ensurdecedor
e do meio do salão
estragar a convenção de fariseus

Agora transformo ideias em realidades
para que do ventre das experiências
possam nascer criaturas
metade serpente, metade pombas
que estejam com vontade de beber
comigo desse cálice

Não permita que se afaste
de mim esse cálice...
Não cale-se!

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Mina Terrestre

Macico M

“É importante ter sonhos grandes o suficiente para não perdê-los de vista quando os perseguimos”
Oscar Wilde

"A Liberdade Guiando o Povo" de Eugène Delacroix

Vou pegar o meu sonho
setepartido
e enterrá-lo
nos quatro cantos do mundo
para que não me torne escravo
da loucura
Quando for criança
vou buscá-lo
Já esqueci onde ele está
terei que persegui-lo
uma terra distante
Eu sei
que quando pisar
nesta terra sobre ele
onde ele está
virá de sob mim
como verme
me devorará
e não haver mais cadáver
mas sim um verme bem alimentado

sábado, 6 de agosto de 2011

Comemorando os 50 anos do Concílio Vaticano II

CNBB, 2011

O Pontifício Comitê de Ciências Históricas promoverá, de 3 a 6 de outubro de 2012, em Roma, um congresso internacional para comemorar o início do Concílio Vaticano II. Os preparativos da iniciativa foram anunciados pelo organismo, presidido pelo padre Bernard Ardura, que o organizará em colaboração com o Centro de Estudos sobre o Concilio Vaticano II da Pontifícia Universidade Lateranense.

O congresso será o início de uma ampla pesquisa internacional conduzida pelas Sociedades de História eclesiástica e pelas Associações de Arquivos eclesiásticos de diversas nações, todas sob a direção do Comitê vaticano.

A pesquisa reunirá documentos de cientistas especializados de diversas nações e deverá se transformar em um ‘manual’ dos arquivos pessoais dos padres conciliares. Na realidade, o encontro será o momento final de verificação, confronto e síntese das pesquisas antes realizadas em vários campos.

A iniciativa terá também um ciclo de conferências organizado em colaboração com o Centre Saint-Louis de France, a se realizar entre fevereiro e março de 2012, sob o tema “Reler os grandes textos do Concílio Vaticano II. História e teologia”. O objetivo será a leitura histórica e teológica dos grandes documentos do Concílio Vaticano II.

No Brasil, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) também se prepara para comemorar a data. Uma Comissão foi formada e uma série de atividades está sendo programada para os próximos três anos.


Originalmente disponível em: http://www.cnbb.org.br/site/imprensa/internacional/7232-comemorando-os-50-anos-do-concilio-vaticano-ii

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

A Igreja: Que É Isso? Para Onde Vamos? Eclesiologia* Mínima

Márcio L'Oliveira



"Ele é a Cabeça do corpo, da Igreja"
(Cl 1,18)

A Igreja é o navio que navega bem neste mundo, ao sopro do Espírito Santo com as velas da Cruz do Senhor plenamente afastadas.
(SANTO AMBRÓSIO)

 “A Igreja quer ser ‘Igreja para o povo’, mas bem pouco ‘Igreja do povo
(J. B. METZ)



“Creio na Igreja Católica?”

Quantas vezes já recitamos na missa: “Creio na Igreja Católica...”: cremos mesmo? O que é crer na Igreja? É importante salientar que não é a mesma coisa que dizer: “Creio em Deus Pai” ou “Creio em Jesus Cristo” ou “Creio no Espírito Santo”! A Igreja não é a divindade; melhor seria dizer: “Creio em uma Igreja...”; para não confundirmos a obra com seu criador. Continuemos com nossa questão: o que queremos dizer quando dizemos: ‘Creio na Igreja’? É crer no papa, no bispo, no padre? É crer no templo ou capela que está na praça? Que é Igreja, afinal? Qual sua origem? Sua identidade? Que nos trás a palavra Igreja? Como compreender a Igreja e sua missão hoje no mundo?

Igreja: Que é isso?

Que é Igreja?

A palavra “Igreja” (do grego, “ekklesia”; do latim, “ecclesia”) significa “chamar fora”, “convocar”, “convocação”[b]. Para os antigos Igreja não começou sendo um nome próprio, muito menos uma instituição, se parecia mais com “o encontro”, “a reunião dos que seguiam Jesus”: “Paulo, Silvano e Timóteo à igreja de Tessalônica, em Deus nosso Pai, e no Senhor Jesus Cristo...” (2Ts 1,1); “Depois que essa carta tiver sido lida entre vós, fazei-a ler também na igreja de Laodicéia” (Cl 4,16). Aqui é o apóstolo Paulo escrevendo as comunidades ou grupos de cristãos nesses lugares. Mas é Paulo quem vai começar a dá o sentido universal e abrangente do termo ekklesia, vai usar para significar “o movimento todo dos cristãos” (cf. 1Cor 16,1.19; Gl 1,2; 2Cor 8,1; 1Ts2,14; Rm 16,4.16)[c]. A Igreja era a pequena reunião do grupo dos discípulos, que se encontravam, “aqui” ou “ali”, que depois toma proporções maiores.

Também, a Igreja não é uma “nova invenção” dos discípulos, muito menos de Jesus: de onde surge a Igreja? No Primeiro Testamento havia a “qahal”, ou seja, “a reunião do povo de Israel”, povo de Javé. Era a “assembléia da comunidade política e cultual”[d]: “Se Javé afeiçoou-se a vós e vos escolheu, não é por serdes o mais numeroso dos povos - pelo contrário: sois o menor dentre os povos! – e sim por amor a vós e para manter a promessa que ele jurou aos nossos pais” (Dt 7,7-8).  É dessa idéia desse “povo eleito” e “querido” de Javé que irá se formar a Igreja a partir do Segundo Testamento das experiências pascais dos discípulos com Jesus, ou seja, a partir da ressurreição os discípulos começam a se organizar como comunidade.

Essa Igreja levada a cabo pelos discípulos ao longo da história adquiriu algumas características especiais; é una, santa, católica e apostólica. O que quer dizer tudo isso? É una porque na diversidade ela é unida e unificada pela força do Espírito Santo; é santa pela presença e atuação de Jesus no seu seio; é católica (do grego “katólon”: que tudo abrange; universal) por sua ‘pretensão missionária’, levar Cristo a tudo e todos; é apostólica porque foi erguida sobre o fundamento dos apóstolos de Jesus[e].

Hoje Igreja tem vários significados: lugar de culto, denominação cristã (igrejas), Igreja católica, comunidade cristã; Igreja pode acenar também para “clero”, padres, bispos. Voltando para sua definição primeira, como a comunidade dos discípulos a entendia e vivia, Igreja somos todos nós, batizados e batizadas convocados por Cristo para construir o Reino de Deus, a assembléia dos convocados: ‘comunidade do seguimento de Jesus’. É a comunidade guiada pelo Espírito, a força do alto prometida por Jesus e manifestada a partir do Pentecostes.

As Imagens da Igreja

Como vamos construir essa Igreja? Qual sua identidade? No Primeiro e Segundo Testamento da Sagrada Escritura encontramos imagens, figuras as quais podemos estabelecer comparações que nos ajudam a “desenhar” o “ser próprio da Igreja”, o que ela é profundamente:

a) o redil ou a grei (curral, cercado) – A Igreja é o redil ou curral em que Jesus é a porta por onde passam todas as ovelhas (cf. LG 6): “Eu sou a porta. Se alguém entrar por mim, será salvo; sairá e encontrará pastagem” (Jo 10,9). O curral das ovelhas, ao qual Jesus é o Pastor e Porta, todas as ovelhas o conhecem e ele conhece todas as ovelhas (cf. Jo 10,3-4), como também ele as conduz para fora, para as pastagens, com liberdade e as deixa entrar para descansar: não as prende, mas as protege. Neste redil não há pastor maior que o próprio Deus, Deus é seu maior e verdadeiro pastor: “Assim diz o Senhor Javé: ‘Certamente eu mesmo cuidarei de meu rebanho e o procurarei. Como pastor cuida de seu rebanho, quando está no meio de suas ovelhas dispersas, assim cuidarei das minhas ovelhas e as recolherei de todos os lugares por onde se dispersam em um dia de nuvem e de escuridão’(Ez 34,11-12). Assim, a Igreja-Redil é o espaço da comunhão, da paz, de encontro sob a carinhosa moa do Pastor Supremo.

b) a lavoura (campo de Deus) – A Igreja é a plantação de Deus onde cresce a Videira Verdadeira a qual todos nós somos seus ramos: “Permanecei em mim, como eu em vós. Como o ramo não pode dá fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim também vós, se não permanecerdes em mim” (Jo 15,4). O Pai é o agricultor deste campo: ele quem cuida, limpa, aduba, poda e deixa crescer. A Igreja é a Lavoura de Deus enquanto está ligada a seu tronco, Jesus; desvinculada deste, é “erva-daninha”, “mato”, é “praga” que deve ser arrancada.

c) a construção (morada, templo) – ele é a Construção de Deus erguida por seus apóstolos (cf. CIC 756). Jesus é a pedra fundamental, “a pedra viva” (cf. Pd 1,4), é nela que essa construção se sustenta: “Isso é, para vós que credes ela será um tesouro precioso, mas para os que não crêem, a pedra que os edificadores rejeitaram, esta tornou-se a pedra angular, uma pedra de tropeço, uma rocha que faz cair” (1Pd 1,7-8). Na morada da Igreja, Jesus, a pedra viva, tudo edifica, mas também faz ruir as paredes que aprisionam ou escondem a luz. A Igreja que estamos edificando é essa Construção de Deus?

d) a Cidade Santa (a Jerusalém Celeste) – “Vi então um céu novo e uma nova terra – pois o primeiro céu e a primeira terra se foram e mar já não existe. Vi também descer do céu, de junto de Deus, a Cidade Santa, uma Jerusalém nova... Não vi nenhum templo nela, pois seu templo é o Senhor” (Ap 21,1-2.22). A Igreja é a imagem dos novos tempos, de um mundo ou sociedade melhor, não uma “entre” as outras, mas uma “com” as outras. Em que isso questiona a nossa Igreja?

São inúmeras as imagens da Bíblia que podemos aludir a Igreja: família, tenda, esposa etc. Como essas figuras colocamos o ideal de Igreja construído na história. Onde esse ideal se aproxima do real? Onde precisa melhorar?

O Reino de Deus e a Igreja

Que é o Reino?

Jesus inicia sua vida pública com a pregação do Reino ou Reinado de Deus: “Cumpriu-se o tempo e o Reino de Deus está próximo. Arrependei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15). Que Reino é esse? Primeiro é importante considerar que a terminologia “Reinado” é mais apropriada que Reino, pois, não estamos falando de reino como governo de uma rei, com castelo etc; segundo, em vários momentos nos Evangelhos Jesus fala do significado do Reinado de Deus, um momento privilegiado disso é o “discurso das parábolas”; é por elas, de forma comparativa e pedagógica que ele revela o ‘mistério do Reinado de Deus’(cf. Mt 13, 11): o Reinado é a semente boa que cresce com o joio, a semente ruim (cf. Mt 13,24-30); é como o tesouro ou pérola encontrada pelo negociante que vende tudo e a compra (cf. Mt 13,44-45); é como a rede que lançada ao mar apanha todo tipo de peixe (cf. Mt 13,47-50); o Reinado de Deus é como a semente que germina e cresce por si só (cf. Mc 4,26-29). Assim, as parábolas nos mostram o Reino como uma realidade avassaladora, implacável, que toma toda vida da pessoa, suas decisões, ações, que o faz entregar-se; é uma nova ordem.

Há um carinho e uma preocupação de Jesus quando fala do Reinado de Deus: “Este Reino manifesta-se aos homens lucidamente nas palavras, nas obras e na presença de Cristo” (LG 5). É o grande projeto de Jesus, mas não só isso! É o que ele pregou, mais ainda, sua própria pessoa. Quando ele chega, se aproxima dos homens ele traz o Reino. Podemos nos perguntar como os fariseus sobre quando chegará ou quando se realizará este Reino, aos quais Jesus responde: “A vinda do Reino de Deus não é observável. Não se poderá dizer: ‘Ei-lo aqui! Ei-lo ali! Pois eis que o Reino de Deus está no meio de vós” (Lc 17,20-21). ‘O Reino se realiza, de certo modo, onde quer que Deus esteja reinando mediante sua graça, seu amor, vencendo o pecado e ajudando os homens a crescer até conseguir a grande comunhão que lhes é oferecida em Cristo’ (cf. P 226); esse Reinado começa aqui na Terra entre todos os homens e mulheres e culmina no Reino dos Céus.

No Reino de Deus ocupa um lugar privilegia do os pobres: o Reino pertence aos pobres e pequenos. Jesus compartilha a vida dos pobres desde a manjedoura até a cruz, conhece a fome, a sede, a indigência. Mas ainda, identifica-se com os pobres de todos os tipos e faz do amor ativo para com eles a condição para se entra no Reino (cf. CIC 544).

O Reinado de Deus é a alegria e a vida da nova proposta de Jesus “para que todos tenham vida e vida em abundância” (Jo 10,10). Ele também traz consigo conseqüências: incompreensão, perseguição, cruz! Será que estamos preparados para ele? Em que a proposta do Reinado de Deus nos inquieta? Estamos construindo o Reino de Deus?

O Reino e sua Relação com a Igreja

O Reino é a Igreja? Não necessariamente. “É da pregação sobre o Reino que nasce a Igreja. Esse Reino sem ser uma realidade separável da Igreja (LG 8a), transcende seus limites” (P 227). O Reino está para além dos ‘muros’ da Igreja, não possui Igreja ou povo; deste a Igreja é sinal, germe e princípio (cf. P 227-228).

Mas, a final, Jesus não fundou a Igreja? Jesus interroga os discípulos sobre o que falam sobre ele, quando depois Pedro responde, ele fala: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja  e as portas do Inferno nunca prevalecerão sobre ela” (Mt 16,18). Jesus “funda” a Igreja enquanto firma com seus discípulos, sua “ekklesia”, sua “comunidade de convocados”, o propósito de levarem a esperança do Reino a todos os cantos. Pedro, líder dos apóstolos, ao mesmo tempo que é o primeiro “Papa”, primeira pedra dessa construção, a qual Jesus é a “pedra fundamental”, também é símbolo de todos os cristãos pedras vivas que fazem acontecer o edifício da Igreja.

“Mas a Igreja de hoje ainda não é aquilo que está chamada a ser” (P 231), ela necessita de permanente auto-evangelização; para ser evangelizadora, precisa evangelizar-se. Os critérios para essas auto-evangelização são os valores do Reino expostos no Evangelho. É vislumbrando o Reinado de Deus que a Igreja peregrina se encontra com sua verdadeira vocação, e “as portas do Infernos não prevalecerão sobre ela” (cf. Mt 16,18b), ou seja, as limitações dos homens que fazem parte da Igreja, os erros da história, nada disso tirará sua força enquanto ela “correr” à seu objetivo.

Igreja, Povo de Deus

Das compreensões mais profundas da essência da Igreja, é a de Povo de Deus que ela se encontra consigo mesma. A Igreja na história percorre muitos caminhos: a vida simples das primeiras comunidades de Jerusalém (nos Atos dos Apóstolos): “Eles mostravam-se assíduos ao ensinamento dos apóstolos, á comunhão fraterna, à fração do pão e às orações” (At 2,42); depois, a identificação com o poder e o Império Romano; a dominação religiosa na Idade Média, ‘todo o mundo católico’; a crise, opulência e perda de sentido na Idade Moderna; mas na contemporaneidade, década de 1960, com o Concílio Vaticano II, ela faz o movimento de “volta a suas origens”: o Povo de Deus.

“Aprouve contudo a Deus santificar salvar os homens não singular, sem nenhuma conexão uns com os outros, mas constituí-los num povo...” (LG 9). Então, Deus convoca Israel como seu Povo. À imagem de Israel no Primeiro Testamento, a Igreja aparece como o Novo Povo de Deus; as pessoas, agora, tornam-se membros deste ‘novo povo’ pelo batismo, não por nascimento, sangue ou família; tem como líder “Cabeça”, Jesus Cristo, “Supremo Pastor” (1Pd 5,4) e chefe de todos os pastores; esse povo é, por natureza, livre, porque no coração de cada um de seus membros reside o Espírito Santo, “vento que sopra onde quer” (Jo 3,8); a lei que rege esse povo é o mandamento novo de Jesus: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 15,12); sua missão é ser sal da terra e luz do mundo (cf. Mt 5,13-16) e sua meta é o Reino, que começa aqui na terra e culmina no fim dos tempos (cf. CIC 782).

Quando a Igreja se compreende como Povo de Deus ela quer superar e evitar um modo individualista de viver a fé (cf. P 235) e ser família, povo santo, peregrino e enviado por Deus[f]. Isso, pois, “a Igreja não é o lugar em que os homens ‘se sentem’, mas o lugar em que se fazem povo, família (cf. P 240): a pergunta não é ‘como me sinto na Igreja’, mas se ‘sou Igreja’. Essa família de Deus é ‘o lar onde cada filho e cada irmão é também senhor’ (cf. P 242) com toda beleza e diversidade próprias de nossas comunidades.

“Se a Igreja é Povo de Deus, isso quer dizer que o seu ministério de comunhão com o Pai, o Filho e o Espírito Santo se vive e se realiza numa condição de povo”[g]; ou seja, a própria maneira de Deus revelar-se é como povo, não um “gueto de santos”, “separados”, mas o povo “com” e “para” os povos, isso para acentuar que não estamos sozinhos no mundo e aqui estamos para servir. É fascinante essa compreensão de Igreja: onde ela está mais presente? Onde precisamos evocá-la?

Igreja, Corpo de Cristo (1Cor 12)

Porque, como o corpo é um todo tendo muitos membros, e todos os membros do corpo, embora muitos, formam um só corpo, assim também é Cristo. Em um só Espírito fomos batizados todos nós, para formar um só corpo, judeus ou gregos, escravos ou livres; e todos fomos impregnados do mesmo Espírito” (1Cor 12,12-13).

Povo de Deus é a realidade visível, peregrina da Igreja. Corpo de Cristo é a realidade invisível, espiritual. Diz respeito à intimidade de Jesus com os seus, ao próximos que acabam se identificando (cf. CIC 787): “Permanecei em mim como eu estou em vós” (Jo 15,4); é o pedido de Jesus para todos permanecermos nele. “A figura do corpo é ilustrativa para explicar a diversidade dos membros e das funções, bem como a unidade de todo em vista do bem comum”[h].

Com podemos compreender melhor isso? Primeiro, a Igreja é Corpo de Cristo, porque é “comunidade de comunhão”. Nela, os que se reúnem partilham sua vida, fé, seus dons. O Corpo (Igreja) integrado a Cristo, - “ele é a Cabeça da Igreja, que é seu Corpo” (Cl 1,18) - faz acontecer a vida comunitária e a esperança do Reino. Não existe vida se o corpo está separado de sua cabeça, assim também, não existe Igreja separada de Jesus, de sua vida, de seu Evangelho, de seu Reino, de sua Cruz e Ressurreição. Por isso todos e cada um com seus dons devem fazer e ser esse “Corpo”; e frente aos conflitos devemos nos perguntar: estamos ligados a nossa Cabeça, Jesus? Nosso Corpo (Igreja, comunidade...) é coerente à sua Cabeça?

A Igreja é Corpo de Cristo, ainda, porque nela acontece a comunhão do corpo eucarístico do Senhor[i]. De forma concreta e espiritual a comunidade ao redor da mesa da Eucaristia se faz Igreja: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele (Jo 6,56). a Ceia é o banquete de todos, sobretudo dos excluídos de nossas comunidades a mesa deve nos ajudar a questionar: onde estão os excluídos de nossa comunidade? quem participa dessa mesa? Porque participa? Quem não participa e porque não participa? Que a comunhão desperta em nós?

A vocação de toda mesa é incluir, “chamar para comer”, ainda mais a mesa eucarística. Os bispos e padres são os “chefes” da mesa; nesse corpo são membros também, mais para servidores que para “donos”; aqui estão para dá o alimento que não é propriedade sua. Assim nos ensinou Jesus na última ceia: “Depois que lavou os pés, retomou o seu manto, voltou a mesa e lhes disse: ‘Compreendeis o que vos fiz? Vós me chameis de Mestre e Senhor e dizeis bem, pois eu o sou. Se, portanto, eu o Mestre e Senhor, vos lavei os pés, também deveis lavar-vos os pés uns dos outros” (Jo 13,12-14).

Igreja dos Pobres

Em nosso Continente Latino-Americano e no mundo subdesenvolvido ou “em desenvolvimento”, há uma realidade concreta frente a nosso olhos: a pobreza, a miséria e indigência. “Essa miséria como fato coletivo se qualifica de injustiça que clama aos céus” (M, p. 9). ‘Essa situação de extrema pobreza generalizada adquire, na vida real, feições concretíssimas, nas quais deveríamos reconhecer as feições sofredoras de Cristo: feições de crianças pobres e abandonadas, feições de jovens desorientados e sem oportunidades, feições de índios e negros em situações desumanas, feições de camponeses sem terra em situação de dependência, feições de operários mal remunerados, feições de subempregados e desempregados demitidos, feições de marginalizados amontoados nas grandes cidades, feições de idosos postos a margem da sociedade’ (cf. P 31-39). Podemos ampliar e atualizar essa lista: “os migrantes, as vítimas da violência, os deslocados e refugiados, as vítimas do tráfico de pessoas e seqüestros, os desaparecidos, os enfermos de HIV e de enfermidades endêmicas, os tóxico-dependentes, idosos, meninos e meninas que são vítimas da prostituição, pornografia ou violência ou do trabalho infantil, mulheres maltratadas, vítimas da exclusão e do tráfico para a exploração sexual, pessoas com capacidades diferentes, grandes grupos de desempregados/as, os excluídos pelo analfabetismo tecnológico, as pessoas que vivem na rua das grandes cidades, os indígenas e afro-americanos, agricultores sem terra e os mineiros” (A 402).

Esses não são só dados para ficarmos alarmados, mas o próprio rosto de Deus desfigurado, o Deus que criou o homem e viu que era muito bom o que tinha feito (cf. Gn 1,31). É do encontro do Evangelho de Jesus com essa realidade “gritante” que nasce a Igreja como Igreja dos Pobres. Os pobres são a grande opção de Jesus: “Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus” (Lc 6,20). Com os pobres não temos uma dívida como se precisássemos lhes dá alguma esmola, mas o encontro com o pobre nos apresenta a esperança do Reinado de Deus e nos aproxima das opções de Jesus.

Todo esse povo reunido clama a Deus e em comunidade torna-se Igreja. A Igreja dos pobres realiza a síntese entre as outras duas visões de Igreja, Povo de Deus e Corpo de Cristo; esse povo é o “Povo dos Pobres”, esse corpo é o “Corpo dos Pobres. Como dizia João Crisóstomo, santo dos primeiros séculos da Igreja (séc. IV): “Queres honrar o corpo de Cristo? Não o desprezes quando está nu; não o honres aqui com vestes de seda e abandones fora no frio e na nudez o aflito. Pois aquele que disse: ‘Isso é meu corpo’ (Mt 26,26) e confirmou com o ato a palavra, é o mesmo que falou: ‘Tu me vistes faminto e não e alimentaste (Mt 25,45)”. Desde o princípio a Igreja já se configurava como Igreja dos Pobres, ou ao menos para os pobres.

Dá para esconder, “maquiar” perder de visa que nossa Igreja é “Igreja dos Pobres”? Já assumimos essa nossa condição? Que fazemos para reavivar a esperança dos pobres (e jovens pobres) de nossas comunidades? Isso pois Jesus ama os pobres mais denuncia toda pobreza como ‘mistério de iniqüidade’, do mal.

A Igreja que se faz pobre, mais ainda, que permite aos pobres se sentirem Igreja a ponto de construírem a Igreja dos pobres, com sua cultura de pobres, com sua situação espoliada (e denunciada profeticamente), com sua forma de celebrara Jesus Cristo que se fez pobre (cf. 2Cor 8,9), com a confiança no Espírito Santo, ‘pai dos pobres’, uma Igreja assim se torna, efetivamente, o sacramento da libertação e pode se apresentar como portadora do mistério da libertação integral”[j].

Para Onde Vamos?

“Quantas vezes ouvimos dizer; ‘Jesus Cristo, sim; Igreja, não’[k]. É cada vez mais crescente uma mentalidade de que a Igreja não “serve” ou não “presta”: é corrupta, opulenta etc; sobretudo no que diz respeito a “hierarquia”, ou seja, o clero: bispos e padres. Com o caminho que fizemos podemos ir para além dessa perspectiva, na compreensão de Igreja com o Povo de Deus peregrino construindo seu Reinado sob a força do Espírito, o “Pai dos Pobres”.

Esse povo tem uma missão nesse mundo: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo” (GS 1). O coração da Igreja é o coração de todo homem e mulher; todo cristão é chamado a viver e anunciar a radical festa do Reino. Santa e pecadora a Igreja segue em frente. Santa por seu Pastor Supremo, Jesus; pecadora por seus membros, limitados, carentes de perfeição. E onde houver erro valha-lhe a profecia para denunciá-lo; onde houver dor que o anuncio da esperança seja voz retumbante.

Vivemos sob a promessa de Jesus: “... e as portas do Inferno nunca prevalecerão sobre ela” (Mt 16,18); mais que uma instituição, um povo, a Igreja é “Mistério”, mistério concreto do amor de Deus revelada na vida de pessoas - santos, mártires - que dedicam sua vida a inexorável causa do Reino de esperança e paz.


Siglas e Abreviaturas

A
Aparecida. V Conferência do Episcopado da América latina e do Caribe
CIC
Catecismo da Igreja Católica.
GS
Gaudium et Spes (As alegrias e as Esperanças). 
Constituição Pastoral do Concílio Vaticano II.
LG
Lumem Gentium (A luz dos povos). 
Constituição Dogmática do Concílio Vaticano II.
M
Medellín. II Conferência do Episcopado da América latina e do Caribe.
P
Puebla. III Conferência do Episcopado da América latina e do Caribe.



*  Eclesiologia é parte da Teologia que estuda o Mistério da Igreja.
[b]No grego comum dac época, “ekklesia” indicava a assembléia dos cidadãos (dos sexo masculino) livres de uma polis ou cidade para fazer eleições... Entretanto, grupos com fortes laços internos, como os primeiros cristãos, desenvolveram rápido o seu próprio jargão... eles fizeram isso em contexto variado: para ‘livre associação’ de cristãos reunidos ‘na casa X’; também para várias comunidades domésticas de uma cidade, ‘a Igreja que fica emCorinto’; usavam para as comunidades cristãs de algumas cidades e finalmente para todos os cristãos do mundo”. Eduard SCHILLEBEECX. Por uma Igreja mais humana. São Paulo: Paulinas, 1989, p. 60. 
[c] Cf. o. c., p. 61.
[d] Cf. Jean-Yves LACOSTE. Igreja, in Dicionário crítico de teologia. São Paulo: Paulinas, 2004, p. 852.
[e] Cf. Medard KEHL. A Igreja: uma eclesiologia católica. São Paulo: Loyola, 1997, p. 117-122.
[f] Isso não é caminho de agora, os cristão desde os primeiros séculos já faziam esse caminho de Povo Peregrino, como está claro na Carta a Diogneto, escrito cristão do século II em que um curioso do cristianismo chamado Diogneto indaga a um discípulo sobre os cristãos, este responde: “Não se destinguem os cristão dos demais, nem pela região, nem ela língua, nem pelos costumes. Não habitam cidades a parte, não empregam idioma diverso dos outros, não levam gênero de vida extraordinário. A doutrina que se propõem não foi excogitada solicitamente por homens curiosos. Não seguem opinião humana alguma, como vários fazem. Moram alguns em cidades gregas, outros em bárbaras, conforme a sorte de cada um; seguem os costumes locais relativamente ao vestuário, à alimentação e ao restante estilo de viver, apresentando um estado de vida (político) admirável e sem dúvida paradoxal. Moram na própria pátria, mas como peregrinos. Enquanto cidadãos, de tudo participam, porém tudo suportam como estrangeiros. Toda terra estranha é pátria para eles e toda pátria, terra estranha”. Alberto BECKHÄUSER (coor.). A Carta a Diogneto. Petrópolis: Vozes, 1976, p. 22.

[g]  José COMBLIIN. O Povo de Deus. São Paulo: Paulus, 2002, p. 134.
[h] Leonardo BOFF. Novas fronteiras da Igreja: o futuro de um povo a caminho. Campinas: Verus, 2004, p. 19. 
[i] BOFF, o., c., p. 20.
[j] Boff, o. c., p. 22.
[k] Yves CONGAR. A Igreja: ponte ou obstáculo? in NEUFELD, K.H. Problemas e perspectivas de teologia dogmáica. São Paulo: Loyola, 1993, p. 200.